Era azul. Índigo. Não, azul royal. Tem gente que chama de azul Klein, acho que é por causa de um tal artista plástico que obcecou com o tom. Não o culpo. Era um azul bonito que só, e brilhava na pracinha escondida nas muralhas medievais.
Era uma cidade meio esquecida. Ficava do lado de um aeroporto de passagens baratas e a pouco de uma cidade amada por todos. O que a gente foi fazer ali eu nem sei mais. Era a cidade de comidas estreladas, de muralhas medievais e do aeroporto das passagens baratas que a gente ignorou. Era a cidade que fechava aos domingos, obrigando os passantes a ir jantar na cidade vizinha: menor, mais escondida e mais charmosa. Era o lugar dos bancos azuis.
Eu sorria pra caramba. Sabe como é, quem está feliz sorri. Eu me achava linda, botava vestidos rodados e coisas no cabelo só para enfeitar. Botava o casaco caro, escolhia as minhas joias e entrava no carro chique para um dia especial. As vezes, não tinha carro: a gente andava de mãos dadas, subia escadas, atravessava os muros e comia sorvetes-biscoito ou biscoitos-sorvete difíceis de esquecer. Atravessávamos pontes vermelhas e sentávamos em bancos azuis. O azul mais bonito do mundo.
É difícil esquecer. É difícil não sentir as mãos. A chuva que ameaçava, as crianças barulhentas brincando na praça. É difícil esquecer a noite da cidade vazia e o banco azul entre muros medievais. Hoje, tenho certeza, a cidade é preto e branco. O sorvete perdeu o doce, tudo ficou silencioso e a chuva caiu de vez. O banco, agora cinza, só recebe as gotas que lavam o resto do azul. Não tem mais a gente, não tem mais azul. O azul mais bonito do mundo.