cobri os olhos pra não vê-lo sumir pelo corredor.
a imagem do ex olhando para mim enquanto esperava o elevador, com cara de pena e tristeza, é a mais marcante daquele 4 de dezembro. dessa vez, era uma cena que eu não queria na minha memória. ele falou: vira de costas. eu fechei a porta e solucei alto.
é uma série de acontecimentos inéditos: a gente chorando andando pela rua. nós chorando abraçados. a gente chora pra caramba, vive um luto conjunto de quem não quer se separar. mas por que, então? eu não entendo muito disso tudo.
eu durmo engasgada e ele fica bem, entretido até as 4 da manhã. ele sempre fica bem e o dia seguinte é só mais um dia. eu quero passar por isso com calma e dignidade, eu apago todos os rastros que eu tenho, abro mão das conversas que eu relia antes de dormir. se um dia a gente acontecer, vai ter um monte de cicatriz e conversas apagadas por toda essa dor.
ele repete que o problema é desejo. eu tento memorizar cada detalhe do pé pequeno, das unhas roídas, da barba quase branca e dos olhos encharcados. ele canta uma saudade engasgada. ensaia falar de amor, de casamento e de outras coisas que a gente nunca vai ver existir. eu memorizo o zíper do casaco enquanto ainda tenho colo, é a contagem regressiva mais dolorida do mundo.
eu pergunto se ele quer tentar. ele pergunta se eu quero tentar.
eu viro de costas e soluço porque a gente não tem coragem.
It ain’t over yet